A imprensa desta semana estampou a face de um governador aberto em
sorriso com a aprovação altíssima de seu governo. Mais de 80%. Os
números têm a magia de arrogarem-se incontestes, irrefutáveis. São a
base das ciências que não exigem maiores níveis de abstração na busca de
verdades e certezas. São para se panfletar à vontade. Positivismo de
pior tipo.
E é nisso que o governo e seus porta-vozes se esbaldam. Esses números
servem para submeter ainda mais os puxa-sacos - imprensa incluída -;
servem para tentar intimidar a oposição e amealhar novos subalternos; e
servem, no caso específico em tela, para ir cacifando o governador em
sua indisfarçável tentativa de alçar vôos nacionais.
Mas este filme dos altos índices de aprovação já foi visto no Brasil e
no mundo, em muitas outras ocasiões. Com crescimento econômico e geração
de empregos, muitos absurdos já foram cometidos no nosso país, e seus
patrocinadores depois caíram no ostracismo, deixando o buraco para as
gerações futuras. O roteiro do governo Eduardo Campos não é original.
O avô do governador mesmo, o velho Arraes – um grande brasileiro -, foi
cassado por um regime que gozava de inegável apoio popular e fazia
propagandas triunfalistas: “Eu te amo, meu Brasil, eu te amo... meu
coração é verde, amarelo, branco, azul anil...”
(http://www.youtube.com/watch?v=J-c-__IhzqI&feature=related). Ou
então: “Este é um país que vai pra frente...”
(http://www.youtube.com/watch?v=VITtfvWM-mg), quase sempre na voz
alugada d’Os Incríveis. Economia crescendo, empregos, povo alegre, mas o
país submetendo-se aos interesses antinacionais e os descontentes sendo
assassinados em porões da ditadura que, anos depois, foi enxotada pela
mobilização popular, combinando luta por democracia e contra a crise
econômica.
Em tempos menos remotos, vimos a supremacia de FHC em nível nacional, a
força de Jarbas Vasconcelos em Pernambuco. Hoje estas lideranças de
outrora já não são assim, digamos, tão triunfantes. Ou seja, os números
em política podem ser fotografias maquiadas, e bem maquiadas. Podem
revelar tão somente a sensação superficial, a epiderme do sentimento
popular, que, como na ditadura, podem ser manipulados. E quando sabemos
que as pesquisas são produtos encomendados, que dificilmente serão
elaborados a contragosto do cliente, as razões para ligar o
desconfiometro devem ser redobradas.
O governo Eduardo Campos é o campeão da maquiagem. Suas peças
publicitárias são uma farsa. Os números apresentados da escola pública
descaradamente não se referem a todas as escolas, mas tão somente às de
referência. O texto na TV é rápido, ligeiro o suficiente para confundir e
esconder que em Pernambuco a escola pública fundamental deixou de ser
universal, para ser focada em grupos minoritários.
As peças publicitárias da saúde vão no mesmo caminho. Número de aumento
de “profissionais de saúde” são mostrados, mas quantos por concurso
público? Quantos são, na verdade, contratados em manobras não
republicanas, por convites, recolocando nosso Estado no período prévio à
Constituição de 1988, quando a sociedade conquistou a positivação
constitucional de que só trabalha no serviço público servidor contratado
mediante concurso? Reparem nas peças da segurança pública. As manobras
se repetem.
Os números apresentados, tanto pelas peças publicitárias quanto pelas
“pesquisas”, estão a serviço da maquiagem de um fenômeno relativamente
novo na política brasileira: as oligarquias com discurso de esquerda. É o
patrimonialismo “moderno”, é a nova direita pós-neoliberal, o
anti-republicanismo que faz questão de confundir democracia com
ineficiência, por um lado, e ordem e eficiência com ausência de
república, de outro.
Assim, bandeiras como participação popular e controle social são
associadas ao atraso. O slogan “deixa o homem trabalhar” (sem
atrapalhar, logo, sem participar, criticar, fiscalizar) é parte desta
estratégia que se vê em várias gestões Brasil a fora.
É curioso que no mesmo momento que o governo “ostente” níveis tão altos
de aprovação, um dos cientistas sociais mais respeitados em nosso
estado, dos mais insuspeitos, escreva um artigo tão na contra-mão da
euforia. Refiro-me a Michel Zaidan Filho, que escreveu um texto,
Natureza e Entropia
(http://edilsonpsol.blogspot.com/2011/08/natureza-e-entropia.html), em
que discorre com maestria sobre as opções antiecológicas do governo
Eduardo Campos.
O texto mostra que hoje quem está nos porões da ditadura do crescimento
irracional é a natureza, pendurada num “pau-de-arara”, e as ações
políticas de antes, são hoje as enchentes, deslizamentos, o aquecimento
global. Façamos como a natureza: não nos submetamos aos números.
Presidente do PSOL-PE
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